Capítulo 4 - António
Araújo, João Páscoa Pinheiro
Agentes físicos 3 - Eletroterapia
de baixa e média frequência
A utilização da
eletroterapia de baixa e média frequência com objetivos terapêuticos.
1 –Principais objetivos formativos
· Eletroterapia de baixa e média frequência – a aplicação de corrente
elétrica com fins terapêuticos.
· As correntesconstantes e as variáveis – principais características físicas
e os efeitos biológicos,as indicações terapêuticas e as técnicas de aplicação.
· A corrente constante - a corrente galvânica e a iontoforese; processos de
utilização / aplicação, indicações terapêuticas, limitações e
contra-indicações.
· As correntes variáveis - a estimulaçãoelétrica sensitiva, os efeitos
biológicos na modulação da dor, as indicações terapêuticas, limitações e
contra-indicações.
· As correntes variáveis – a estimulação elétrica motora, os efeitos
biológicos na contração muscular, as indicações terapêuticas, limitações e
contra-indicações.
· A regeneração tecidular
2
– Introdução - A
eletroterapia é uma técnica comum no arsenal terapêutico da Medicina Física e
de Reabilitação. Por definição corresponde ao uso de uma corrente elétrica com fins
terapêuticos.(1)
A eletroterapia baseia-se na utilização
dos efeitos biológicos de um estímulo (não ionizante) sobre os tecidos vivos. Esses
efeitos, amplamente demonstrados tanto in vitro e in vivo, podem
ser resumidos na produção de fenómenos eletroquímicos, na capacidade para a
estimulação nervosa, tanto sensitiva como motora, e no aporte energético.(2)
De forma a simplificar e facilitar a
compreensão das diferentes correntes elétricas disponíveis, as correntes são
classificadas de acordo com o tipo de onda, a sua polaridade, os mecanismos
pelos quais atuam, os efeitos produzidos, etc. As correntes elétricas são assim
agrupadas em diversas famílias, de acordo com os parâmetros que as
caracterizam.Dois desses parâmetros, a intensidade e o tempo, permitem
classificar as correntes, quanto ao seu estado, em constantes e variáveis,
sendo esta a classificação mais simples, didática e a mais utilizada na
literatura médica. Nas correntes de estado constante não ocorre variação da
intensidade ao longo do tempo (excepção nos períodos de encerramento e abertura
do circuito). Nas correntes em estado variável ocorre variação da intensidade (entre
outros parâmetros físicos) ao longo do tempo de utilização.(1)
No entanto, não é possível compreender
os
efeitos terapêuticos da corrente elétrica semconhecer as bases físicas que a
suportam, por isso é essencial entender a física da energia elétrica e as propriedades
do eletromagnetismo, associado ao conhecimento prévio das características e
propriedades dos tecidos biológicos e a interação do agente com o tecido.
3 – Conceitos gerais de eletroterapia - A
eletricidade é a manifestação da libertação e circulação da energia dos
eletrões, geralmente na última camada atômica.(3) A
corrente elétrica corresponde, assim, ao deslocamento do fluxo de eletrões através
de um meio condutor.(4)
Alguns
conceitos físicos ajudam a compreensão da técnica:
-
Carga elétrica, como a quantidade de eletrões disponíveis, num determinado
momento, num determinado local (matéria ou acumulador). É uma propriedade
física fundamental que determina as interações eletromagnéticas.
-
Diferença de potencial, como a diferença em energia potencial elétrica por
unidade de carga elétrica entre dois pontos. Pode representar uma fonte de
energia ou energia armazenada. Unidade de medida volts (V).
-
Polaridade, que explica o deslocamento dos eletrões que têm tendência ao
equilíbrio e assim passam das áreas em excesso (carga -) para as áreas de
défice (carga +).
-
Intensidade (I), como a quantidade de energia que passa num determinado ponto
em cada segundo. Unidade de medida ampere (A).
-
Resistência elétrica (R), que representa a matéria que se opõe ao movimento dos
eletrões (propriedade da matéria). Unidade de medida Ohm (Ohm).
-
Potência, que representa o trabalho ou capacidade de realizar trabalho por
segundo. Unidade de medida watt (W).
-
Efeito calórico (Q), que é um fenómeno decorrente da lei de Joule - Q = I2
x R x t, pela qual se concluiu que a intensidade da corrente é o fator
mais importante na produção de calor.(3,4)
Ainda
na classificação dos diferentes tipos de correntes elétricas são tidos em conta
os parâmetros da frequência eda forma da corrente (retangular, trainagular,
exponencial, sinusoidal, …).
A
frequência de uma corrente (o número de ciclos por segundo) genericamente
classifica-se em baixa (inferior a 1.000Hz), média (entre 1.000Hz e
100.000Hz) e alta (superior a
100.000Hz). (Figura 1)
Frequência |
Variação |
Efeitos |
Técnica de aplicação |
Baixa |
1 Hz – 1.000 Hz |
Excitomotor Sensitivo |
Diretamente sobre a pele |
Média |
1.000 Hz -100.000 Hz |
Sensitivo Excitomotor |
Diretamente sobre a pele |
Alta |
> 100.000 Hz |
Térmico Anti-inflamatório |
A certa distância |
Figura
1 – A corrente elétrica segundo a frequência de aplicação.
As
correntes elétricas classificam-se também em constantes ou variáveis. As
correntes constantes têm intensidades e frequências mantidas ao longo do tempo,
como a corrente galvânica, enquanto as correntes variáveis apresentam diferentes
intensidades ou frequências numa determinada unidade de tempo.(1,4)
4 – Corrente de baixa
frequência
4.1 – Corrente constante
- A
corrente constante galvânica é uma corrente contínua, unidirecional, de baixa
tensão(60-80 volts) e intensidade não superior a 200mAmp.(1)
Os
seus efeitos biofísicos ocorrem segundo 3 níveis de intervenção:
-
Eletrotérmico, onde o movimento de partículas carregadas num meio condutor
produz microvibrações e fricção, forças estas que geram calor.
-
Eletroquímico, com a dissociação eletrolítica e acumulação de iõesem cada
elétrodo.
-
Eletrofísico, com a excitação de nervos periféricos e promovendo influência diretaou
indireta sobre a componente neural ou muscular.
Os
efeitos fisiológicos da corrente galvânica dividem-se em efeitos polares e
interpolares.
Os
efeitos polares que ocorrem a nível do ánodo (polo positivo) são caracterizados
por uma reação ácida, com produção de ácido clorídrico e libertação de oxigénio
(Cl + H20 = HCl + O2), ocorrendo fenómenos de coagulação, vasoconstrição e ação
analgésica valorizável. Quando a reação é intensa, há risco de queimadura
local.
Ao
nível do cátodo (pólo negativo) ocorre uma reação alcalina, com produção de
soda cáustica e libertação de hidrogénio (Na + H2O = NaOH + H+), ocorrendo
fenómenos de espasmólise e vasodilatação, com ação hiperemiante e neuro
estimulante local. O risco de queimadura com liquefação é mais intenso.
A obtenção do efeito terapêutico pretendido obriga à selecção do
pólo adequado, que se designa por elétrodo activo.
Os
efeitos interpolares decorrem da passagem da corrente
galvânica através de um segmento corporal e incluem, para além dos efeitos analgésicos,
vasomotores e tróficos, um efeito térmico pouco significativo.(4)
A
dosagem é determinada pelo tamanho dos elétrodos, a intensidade da corrente, o
tempo de aplicação e a tolerância individual do paciente. Aplicam-se geralmente
entre 1 e 5 mA em pequenos elétrodos, e entre 1 e 12 mA em grandes elétrodos.(3)
A
galvanização pode ser aplicada de forma longitudinal, segundo o maior eixo do
segemento a tratar (por ex. trajeto do nervo ciático no membro inferior),
transversal, segundo o menor eixo do segmento a tratar (por ex. gonartrose
fémuro-tibial), monopolar, com elétrodo indiferente ou banho galvânico com
imersão total ou segmentar.(3)
O
tempo de aplicação é de 10-15 min, mas se for bem tolerado, pode demorar até
30-40 minutos.
4.1.1 - Iontoferese - A
iontoforese consiste na introdução de moléculas ou átomos com carga elétrica em
tecidos utilizando um campo elétrico. A sua aplicação é baseada no fenómeno
físico de repulsão e atracção de cargas elétricas, assim, introduzido no corpo
os iões colocados no elétrodo da mesma polaridade.(5)
Usamos
as reações polares anteriormente abordadas para introduzir os princípios ativos
colocando-os sob o elétrodo com a mesma carga.
O
número de iões transferidos é directamente proporcional à concentração de iões
da solução, a intensidade da corrente utilizada e o tempo de fluxo da corrente.
É necessário ter em mente que o tecido cutâneo não tolera intensidadesde
corrente superiores a 1 mA/cm2 para evitar a ocorrência de queimaduras sob o
elétrodo.(2)
As
indicações terapêuticas mais comuns são (Quadro 1):
-
Tratamento de patologia inflamatória local / superficial (tendinopatias,
ligamentites, patologia articular, …), onde os fármacos habitualmente utilizados
sao anti-inflamatórios não esteróides, corticoides como a prednisolona, entre
outros.
- Tratamento de dor aguda ou dor crónica localizada em estruturas
não muito profundas, utilizando o fentanilo, a lidocaína, a ketamine entre
outros.
- Tratamento de calcificações tendinosas e musculares, utilizando
o ácido acético(4).
Todas estas substâncias farmacológicas devem sempre ser disponibilizados
na forma de soluções salinas, ionizáveis.
Trata-se de um processo terapêuticodirecionado a estruturas /
tecidos moles de superfície, considerado genericamente eficaz, de baixos riscos
e de custos muito limitados. A evidência científica não é altaainda que existam
diferentes estudos que demonstram a difusão do princípio ativo de forma
loco-regional. Justifica-se a realização de outros estudos, controlados e com
metodologias acertivas por forma a potenciar a qualidade da técnica.
Fármacos |
Elétrodo |
Efeito |
Iodeto de potássio a 2% |
- |
Fibrinolítico |
Cloreto de cálcio a 2% |
+ |
Analgésico; mineralizante |
Ácidoacético a 2% |
+ |
Diminuição de calcificações |
Procaína a 1% |
+ |
Analgésico |
AINE
em solução salina (p.ex. indometacina, diclofenac, cetoprofeno) |
- |
Anti-inflamatório; analgésico |
Alfaquimiotripsina a 1% |
+ |
Antiedematosoe fibrinolítico |
Quadro 1: Exemplos de substâncias utilizadas em iontoforese.
Este
método é vantajoso pois permite evitar efeitos iatrogénicos dos fármacos
aplicados, tendo um efeito terapêutico local com concentração máxima e
concentração plasmática mínima. Permite ainda a administração de pequenas doses
de fármaco durante longos períodos com efeitos secundários reduzidos.
No
entanto apenas é possível a aplicação de drogas ionizáveis e é difícil definir
a dose a administrar uma vez que a determinação da concentração local não é
exata.(2). A utilização de elétrodos com
reservatório pode facilitar odoseamento do princípio ativo e desta forma tornar
mais objetiva a dosagem utilizada na aplicação terapêutica.
Como
contra-indicações para a sua aplicação verifica-se a presença de elementos
metálicos na proximidade, lesões cutâneas, alterações da sensibilidade cutânea
(risco de queimadura) ou a gravidez (aplicação na região abdominal ou próxima).
Os
efeitos secundários principais da técnica são as queimaduras e irritação
cutânea no local de aplicação, estando estes efeitos dependentes da
sensibilidade cutânea individual, irritabilidade ao fármaco e tipo de corrente
utilizada e a sua correta aplicação.(1,4)
4.2 - Correntes variáveis
de baixa frequência - As correntes variáveis
apresentam como característica comum a variação da intensidade em função do
tempo. Estas correntes podem classificar-se quanto ao tipo de fluxo
(interrompidas ou não-interrompidas), polaridade e frequência.
A polaridade representa o sentido do fluxo elétrico entre os dois
pólos do circuito. Quando os eletrões circulam sempre no mesmo sentido, a
corrente diz-se monopolar. Quando existe variação da polaridade, a corrente
diz-se bipolar, podendo apresentar impulsos simétricos ou assimétricos. os
impulsos assimétricos podem ser compensados, quando a carga de ambas as fases é
igual, ou descompensados, quando essa carga é diferente.(1)
As correntes retangulares são correntes em que, na abertura do
circuito, a intensidade aumenta acentuadamente até um limite predeterminado, é
mantido em plateau durante o período
de tempo estipulado e, em seguida, cai subitamente para zero. É exemplo a corrente de Trabert, formada por impulsos retangulares, unidirecionais,
com uma duração de 2 ms com pausas de 5 ms. O uso desta corrente deve ser de
curta duração e com variação contínua da intensidade para que não ocorra
acomodação. Pela sua frequência de 142Hz, o efeito é fortemente analgésico sendo
utilizada em quadros dolorosos de etiologia raquídea lomabr / lombociatalgia e
cervical /cervicobraquialgia.
As
correntes progressivas podem ser lineares, farádicas ou exponenciais em que o
aumento e decréscimo da intensidade ocorrem de forma gradual, estas correntes têm
particular utilidade em quadros clínicos de desinervação parcial ocorrendo uma
estimulação excito-motora seletiva.
As
correntes moduladas são correntes em que ocorre modulação quer da frequência,
da intensidade e do tempo de estimulação, como as correntes diadinâmicas de
Bernard.(2)
As
correntes diadinâmicas são formadas por impulsos sinusoidais que têm uma
frequência fixa de 50 ou de 100Hz e é a forma como se combinam estas
frequências que se obtem os 5 tipos fundamentais de correntes diadinámicas:
-
Monofásica fixa (MF), como uma corrente unidirecional, contínua, 50Hz, efeito
trófico mas mal toleradas.
-
Difásica fixa (DF), como uma corrente de 100Hz com impulsos sinusoidais de 10ms
de duraçãoo e sem pausa entre eles. É o resultado da fusão de duas correntes MF
desfasadas no tempo. O seu principal efeito é analgésico, noentanto facilmente
ocorre acomodação.
-
Curtos períodos (CP), composta por uma corrente MF de 1 segundo de duração,
seguida de uma corrente DF de 1 segundo de duração. Tem efeitos tróficos e
mio-relaxantes e é menos propícia aos fenómenos de acomodação uma vez que os
impulsos são menos homogéneos.
-
Longos períodos (LP), composta por uma corrente MF de 6 segundos seguida de
outro período de 6 segundos de uma corrente DF. Tem efeito analgésico.
-
Ritmo sincopado, composta por uma corrente MF de 1 segundo de duração, seguida
de uma pausa de 1 segundo. Tem efeito excitomotor e protege o músculo da fadiga
devido ao segundo de pausa.(4)
A eletro-estimulação pode ter efeito motor, utilizado em
eletrodiagnóstico, eletromiografia e estimulação neuro-muscular ou efeito
sensitivo, utilizado em eletro-analgesia. As correntes utilizadas para
eletro-estimulação podem ser de diferentes tipos, consoante o efeito
terapêutico pretendido e os recursos disponíveis. (6)
4.3 - Correntes variáveis
de média frequência - As correntes de média
frequência caracterizam-se por impulsos sinusoidais alternos com uma frequência
entre 2000 e 10.000 Hz, habitualmente até aos 4.000Hz.
A finalidade destas correntes é poder aplicar intensidades altas
para conseguir um maior efeito fisiológico e com maior poder de penetração nos
tecidos, sem provocar lesões cutâneas.(2)
Com o aumento da frequência de uma corrente, diminui a resistência
dos tecidos que atravessa, sobretudo a pele, sendo melhor tolerado apesar da
intensidade elevada, demonstrada pelos trabalhos de D’Arsonval.
A aplicação desta corrente está baseada no princípio da
interferência, quer dentro do organismo (método tetrapolar) ou no próprio
equipamento (método bipolar), de duas correntes alternas sinusoidais de media
frequência para que a corrente resultante da interferência destas duas
correntes tenha as propriedades e efeitos de uma corrente de baixa frequência.
A corrente resultante deste fenómeno tem uma frequência que vai de 0 a 250Hz,
determinando no interior dos tecidos efeitos biológicos relativos à frequência
resultante, intitulando-se corrente interferencial ou de Nemec. (3)
A aplicação destas correntes deve ser evitada em doentes
portadores de pace-maker, aplicação na zona torácica, áreas infeciosas ou
tumorais e está contra-indicada na gravidez.(4)
5 – Estimulação elétrica
sensitiva - Os efeitos analgésicos da
estimulação elétrica sensitiva assentam em parte na teoria do gate-control, formulada por Wall e
Melzack em 1965.(5)
A dor origina-se na ativação dos recetores nociceptivos
periféricos que por sua vez estimulam as fibras de pequeno diâmetro, pouco ou
nada mielinizadas, de condução lenta, tipo A-delta e C que são responsáveis por
transmitir os impulsos dolorosos até ao corno dorsal da medúla, e desde aí
seguindo até aos centros superiores de dor no sistema nervosa central. Ao mesmo
tempo existem conexões das fibras A-delta e C com os neurónios do corno
anterior da medúla que produzem uma contração muscular reflexa responsável por
novos estímulos dolorosos que condicionam a cronicidade do quadro clínico.
As fibras nervosas de maior diâmetro, mielinizadas, tipo A-beta e
A-gama, de condução rápida, quando ativas vão estimular os interneurónios
moduladores localizados na substância gelatinosa de Rolando, lâmina II da
substância cinzenta (H central), localizados no corno dorsal da medula e assim
inibir a transmissão do estímulo nociceptive pelas fibras A-delta e C.(3)
O equilíbrio entre a ativação das fibras de pequeno e grande
calibre vai determinar a percepção dolorosa e, assim, mediante manipulação
externa, com a eletroterapia analgésica, pode-se modificar este equilíbrio a
favor da despolarização das fibras de maior diâmetro e por conseguinte a
interrupção da transmissão do estímulo doloroso.
Postula-se ainda que a estimulação elétrica sensitiva atuará sobre
centros nervosos supra-medulares que, através de vias descendentes, vão inibir
a passagem dos estímulos dolorosos a nível da substância gelatinosa de Rolando
– bloqueio supra-segmentar.
Há ainda a destacar o bloqueio antidrómico, pelo qual uma corrente
analgésica com uma intensidade, frequência e duração de impulsos
suficientemente elevados promovem a despolarização das fibras nociceptivas e
bloqueiam a integração de outros estímulos dolorosos. Este tipo de correntes no
entanto é habitualmente mal tolerado.(4)
Existem diversas correntes utilizadas com fins analgésicos, como
as correntes de Trabert, as correntes diadinâmicas, as correntes
interferenciais e as várias correntes usadas para estimulação nervosa elétrica
transcutânea (TENS).
A TENS é uma modalidade de estimulação elétrica sensitiva muito
difundida que utiliza dispositivos portáteis de baixo custo, fáceis de
utilizar, alimentados por pequenas baterias e que transmitem a corrente através
de elétrodos de superfície, sendo por isso muito utilizados em ambulatório
particularmente no tratamento dos síndromes e patologias de dor crónica.(1,7)
As correntes utilizadas variam, mas as bifásicas simétricas ou
assimétricas compensadas são as mais utilizadas e melhor toleradas em
tratamentos de longa duração.
Existem diferentes modos de utilizar o TENS de acordo com a
definição dos diferentes parâmetros de frequência, intensidade e duração do
impulso, atuando cada modo por um mecanismo diferente.
De uma forma geral, a modalidade agrupa a estimulação de alta
frequência e baixa intensidade (High TENS) e a estimulação de baixa frequência
e elevada intensidade (Low TENS).
A modalidade High TENS, de frequência de 50-250Hz, produz um
efeito analgésico através do mecanismo gate-control, em que a intensidade é
crescente até à sensação parestésica no local de dor. É melhor tolerada, no
entanto ocorre acomodação e o efeito analgésico não é prolongado.
Por outro lado, o Low TENS, de frequência <50Hz e intensidade
elevada, produz analgesia pela libertação de endorfinas do sistema nervosa
central. Esta estimulação é habitualmente mal tolerada, no entanto a acomodação
é mais difícil e o efeito analgésico é prolongado no tempo.(3)
A estimulação elétrica sensitiva está indicada em diversas
situações dolorosas. As correntes de Trabert, pelo seu efeito dinamogénico,
estão especialmente indicadas nas contraturas musculares, mas produzem
facilmente acomodação. Este efeito indesejável é limitado nas correntes
diadinâmicas, cuja utilização permite, consoante a modalidade selecionada, a
obtenção de um efeito predominantemente analgésico.
As correntes interferenciais estão indicadas, entre outras
situações, em contraturas musculares, raquialgias e insuficiência venosa.(2)
As indicações do TENS incluem neuropatias periféricas, nevralgias
pós-herpéticas, algoneurodistrofias, dores agudas e dores crónicas (neuropáticas,
nociceptivas, reumáticas e oncológicas).
Os aparelhos de eletro-estimulação não devem ser utilizados em
doentes com alterações de sensibilidade ou de consciência ou doentes com dores
de etiologia não esclarecida. Deve-se evitar a estimulação elétrica na região
pré-cordial, em doentes portadores de pace-maker, bem como na região ocular,
seio carotídeo, cartilagens de crescimento, neoplasias, infecções, ou implantes
metálicos (no caso de correntes monopolares ou bipolares não compensadas). Está
contra-indicado na gravidez, quando na região abdominal. (1)
6 - Estimulação elétrica
motora - Uma das propriedades das correntes de
baixa frequência é a capacidade de poder induzir uma contração muscular
mediante a estimulação das fibras nervosas motoras (0,01ms) ou diretamento o
músculo (1ms).
Para produzir estimulação motora, o estímulo selecionado deve
possuir intensidade e duração adequadas. Reobase é a intensidade necessária
para produzir uma contração muscular quando se usam impulsos retangulares com 1
segundo de duração. (4)
No entanto a célula muscular normal necessita de uma intensidade
muito superior se o impulso for triangular uma vez que esta tem a capacidade de
acomodação. Uma vez ultrapassado o limiar de estimulação motora, pequenos
aumentos da intensidade condicionam grandes aumentos do número de unidades
motoras recrutadas.(2)
Cronaxia refere-se ao tempo necessário para um impulso retangular
com intensidade dupla da reobase produzir uma contração muscular e que no
músculo desinervado se apresenta bastante aumentada.
No músculo existem
dois tipos de fibras musculares: as fibras tipo II ou fásicas, sensíveis à
fadiga e inervadas por unidades motoras rápidas e as fibras tipo I ou tónicas,
inervadas por unidades motoras lentas e resistentes à fadiga.
Numa contração
muscular voluntária, as primeiras fibras a contrair são as fibras tónicas e só
em caso de ser necessário maior força se contraem as fibras fásicas. (4)
Com a aplicação de frequências altas (70-100Hz) obtem-se
contrações mais eficazes e vigorosas, uma vez que ativamos todas as unidades
motoras de uma só vez e preferencialmente as fibras fásicas, o que não sucede
na contração voluntária em que há um recrutamento sequencial das fibras e
sempre em primeiro ligar as fibras tónicas. Estas frequências tetanizantes
produzem assim fadiga muscular precoce uma vez que não há um padrão fisiológico
de recrutamento rotativo das fibras.(6)
A atrofia
muscular por imobilização constitui a aplicação mais frequente e inclui as
atrofias por lesão musculo-esquelética secundária a traumatismo, patologia
articular inflamatória ou mecânica, pós-operatório ou por acamamento
prolongado.
A estimulação
elétrica está indicada sobretudo nas fases agudas e subagudas dos processos
traumáticos quando não é possível realizer exercícios de fortalecimento
muscular e deste modo pode-se manter o trofismo e a força sem causar dor ou
agressão tissular.(7)
O tamanho dos
elétrodos deve ser proporcional ao tamanho do músculo a estimular. As
frequências altas são melhor toleradas no entanto deve-se ter em atenção o
tempo de impulso e de pausa que deve ser 3 a 4 vezes o tempo do impulse para
não desencadear fadiga num músculo débil.
Nas lesões neurológicas centrais, como a lesão medular ou cerebrovascular,
utiliza-se a estimulação elétrica para controlar a espasticidade ou para
melhorar certas formas de funcionalidades nomeadamente na estimulação de um
padrão de marcha.(5)
Em lesões nervosas periféricas utiliza-se a estimulação elétrica
para evitar atrofias musculares, fibrose e para manter as propriedades de
contratibilidade da fibra muscular até ocorrer a reinervação. Como estes
músculos desinervados perderam a capacidade de acomodação com intensidades
progressivamente maiores, utiliza-se correntes com impulsos exponenciais, com
tempos de repouso prolongados e em sessões de curta duração para assim
estimular seletivamente as fibras afetadas, evitando a sua fadiga uma vez que
são mais susceptíveis.(3)
Como parte do tratamento multidisciplinar, a estimulação
neuromuscular pode ser utilizada na incontinência de esfíncteres, quer na forma
urinária quer na anal. Integrada em programas combinados com cinesiterapia do
pavimento pélvico ou medidas comportamentais, pretende-se fortalecer a
musculatura pélvica e relaxar o músculo detrusor mediante a sua estimulação com
corrente elétrica através de elétrodos endocavitários ou externos. São
utilizadas correntes bifásisas simétricas e interferenciais sem polaridade para
evitar riscos de queimadura nas mucosas.
Na incontinência de urgência usam-se frequências de 5-10Hz para
ajudar a relaxar o detrusor, já na incontinência de esforço ou mista
utilizam-se frequências mais altas, 10-50Hz tendo em vista o fortalecimento da
musculatura do períneo. (5,6)
7 – Regeneração tissular
- Através
da aplicação de uma corrente elétrica há um estímulo circulatóriocom chegada de
nutrientes e oxigênio para a reparação dos tecidos. Ocorre também uma
estimulação do retorno venoso, o que facilita a drenagem de produtos de
resíduos acumulados. (4)
Ambos
os fenómenos são essenciais no controlo do processo inflamatório e edema.
Associadamente há uma estimulaçãodo metabolismo celular o que contribui para o
rearranjo e reestruturação do tecido da matriz.
A
estimulação elétrica no tratamento de feridas inclui a passagem da corrente
através de elétrodos de superfície sobre o perímetro da lesão. A corrente
estimula processos bioelétricos endógenos causando uma reação inflamatória e
migração fagocítica de células reparadoras para o local da lesão.
Os
benefícios da eletroterapia no tratamento de úlceras crónicas são dados pelo efeito
antimicrobiano, estimulação da circulação local e aumento da taxa de
regeneração do tecidoe tem a vantagem de ser um método não invasivo, sem
efeitos adversos.
Utilizando
uma corrente elétrica é, assim, possível estimular a autólise, granulação e
epitelização de zona ulcerada, sendo útil em úlceras de pressão grau III, IVe
também grau II refratárias ao tratamento convencional.(2,6)
8 – A utilização das
correntes de eletromedicina e a evidência - Relativamente à
aplicação da iontoferese diversos estudos mostram a sua eficácia no contolo da
dor e na promoção da mobilidade. Um estudo randomizado e controlado em doentes
com traumatismo cervical (8) demonstrou que a
iontoferese com dexametasona foi superior ao tratamento conservador habitual no
controlo da dor e da função cervival.
Uma
revisão sistemática e meta-análise referem que a iontoferese e a lidocaína foi
eficaz no alívio da dor nocicetiva, nomeadamente em tendinopatias, sindrome do
túnel cárpico e dor lombar (9). Uma revisão
sistemática estudou a eficácia da iontoferese no tratamento das fasceite
plantar, uma patologia de tecidos moles plantares com evolução habitualmente
crónica (10). Esta revisão refere que a iontoferese com corticóides e com
anti-inflamatórios promove alívio da dor e aumenta a funcionalidade. Fica ainda
referido, uma constante nestes estudos, a necessidade de continuar a pesquisa
de forma a identificar os melhores protocolos terapêuticos e o tempo de
eficácia clínica.
Relativamente
à utilização do TENS no controlo da dor, um estudo randomizado e controlado
refere que em doentes com artroplastia total do joelho, o TENS promoveu uma
redução significativa na intensidade da dor e no consumo de analgésicos
opióides, comparativamente ao grupo controlo (11). Um outro estudo randomizado
e duplamente cego, controlado com placebo (12), em doentes com sindrome de dor
regional complexa, refere que os doentes tratados com TENS apresentam uma
redução significativa da dor, melhor função e melhor percção da qualidade de
vida.
Uma
revisão sistemática e meta-análise (13) realizada durante o trabalho de parto,
refere que o TENS é eficaz na redução da intensidade da dor, comparativamente
ao grupo controlo, sem apresentar efeitos adversos valorizáveis.
9 - Bibliografia
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